34° Inverno Cultural UFSJ: os trabalhadores da arte no centro dos holofotes

Publicada em 26/06/2023

Rostos fatigados, cenário industrial e suor do trabalho. Operários, de Tarsila do Amaral, completa 90 anos e marca o rompimento da artista com a experimentação estética, ao explorar as paisagens rurais e seguir na tentativa de construção de uma identidade brasileira. Tarsila passa a se engajar na pesquisa social, se debruçando sobre o cenário político. O quadro tem como função simbolizar a diversidade étnica e a realidade laboral da época por meio das feições de 51 trabalhadores, agindo em defesa das pautas defendidas por esses cidadãos frente ao poder estatal. A produção se dá antes dos direitos trabalhistas serem conquistados pelos trabalhadores urbanos da indústria, durante o governo de Getúlio Vargas.

De acordo com a análise do professor Francislei Lima da Silva, docente de História da Arte na UFSJ, a imagem escolhida para o Inverno Cultural deste ano é representativa das questões emergentes que o país discutia. Em 1933, Tarsila do Amaral visitou a Rússia, e o contato com o movimento proletário traz a temática social para suas telas, evidenciando a diversidade cultural do Brasil. “Não mais a paisagem fantástica ocupada por criaturas do folclore brasileiro, ou por corpos sem rosto em meio a uma cidadela mineira ou no morro de uma favela. Surgem em destaque as trabalhadoras e trabalhadores que possuem marcas expressivas em seu retrato, alguns cansados, com os cabelos curtos, massificados. Apropriada e (re)significada pelas/os artistas contemporâneas, o quadro se torna potente para evidenciar pessoas e grupos excluídos de nossa história.”

Operários da Arte
Esse é o tema do 34º Inverno Cultural UFSJ, que tem como grande inspiração a obra de Tarsila do Amaral. Nessa releitura, os trabalhadores da arte merecem destaque, por suas conquistas, lutas e desafios. Dos artistas plásticos aos produtores, todos os que ganham a vida através da arte são os novos rostos dessa moldura que constroem a Arte. A desvalorização da classe artística começa a ser revertida, depois de toda a dificuldade que se ampliou diante de um cenário pandêmico e conservador, no qual o descaso governamental manteve as atividades culturais fora das ruas, afastada do público.

“A ideia é que a gente possa trabalhar várias questões, tanto da classe artística e dos direitos desses trabalhadores, que sofreram tanto com o isolamento social, quanto também dialogar com a memória afetiva dessa cidade, que teve um momento histórico marcante com as fábricas”, relata o pró-reitor de Extensão e Cultura da UFSJ, Chico Brinati, coordenador geral do festival.

O palco principal do Inverno será montado na antiga Fiação e Tecelagem João Lombardi, uma das remanescentes do período áureo da indústria têxtil regional. A história da usina se inicia com a vinda de Giovani Biagio Caetano Lombardi, imigrante italiano que chega ao Brasil às vésperas da I Guerra Mundial. Adotando o nome de João Lombardi, trabalhou algum tempo no porto do Rio de Janeiro, até se mudar para a colônia de imigrantes italianos que se formava em São João del-Rei. Durante o século XX, seus investimentos influenciaram significativamente a economia e a empregabilidade do município, que se costurava aos brins e às flanelas.

Em breve, a Fábrica Brasil não fará mais parte do cenário da cidade, mas a memória permanecerá. André Frigo, jornalista e escritor são-joanense, reforça a importância de se narrar as histórias dos operários no palco da fábrica. “Esse resgate chama a atenção também para um patrimônio que faz parte da história de São João e possibilita que a crônica da cidade seja contada pelas pessoas mais simples da comunidade.”



Texto: Lis Cruz e Sarah Resende
Bolsistas Assessoria 34º Inverno Cultural